07 julho 2014

Sofisticação


    Foi sofisticado, o sentido em que ela o olhou; ele estava ali, parado, em frente à cama dela, ela simplesmente sorriu. Não existia a frágil limitação de ser nada daquilo o que não era, precisava ser exatamente da maneira como realmente era. Era quente ali, era frio lá fora. Era descrente ali, era moralizado lá fora. Ali, justamente ali, era onde existia cumplicidade, onde nada era frágil, onde não existia medo, era solto. Não sabia exatamente o porquê, mas era. 
    Sós, estavam a sós, e ele, por mais absurdo que pareça, sentia o suspiro dela, ouvia-o, enquanto ela o olhava. Foi quando, depois de quase um ano deles juntos, ela mexeu nos cabelos, e falou: não quero mais isso de poliamor, quero só você! Ele não sabia o que dizer, nem da forma como olhar, aquilo era, era amor, era o amor mais admirável, assombroso, prodigioso, magnífico, que já havia sentido. Mas só dela era algo não poderia ser. Não por mais ninguém, e sim por aquilo o que escolheu, o que determinou: as pessoas nunca são, elas estão. E assim como ele perdeu um grande amor, não fechava-se pro mundo. Dos cheiros mais malucos que já sentiu, dos melhores sexos que já teve, dos cabelos mais cheirosos, dos sorrisos mais excitantes, dos sussurros que não lembrava, dos gritos que nunca imaginou... Não era disso que tinha medo de não mais ter, ser e ter são coisas extremamente distintas, ele enchia o peito, apesar de nada falar, aquele era, sem dúvida alguma, o maior amor que ele já havia conhecido, e na plenitude daquele sentimento, não queria perdê-lo. Entretanto, entretanto, ele não pertencia a ela, ela não pertencia a ele; já não sabia mais a determinação precisa daquilo tudo, não sabia.
    Talvez ela fosse entender, talvez não fosse. Ele caminha na direção da cama, senta-se, e fala: eu gosto de ti o suficiente pra não querer te dividir com mais ninguém, e é, exatamente, por isso que não negarei a ti a liberdade que me dou, que me tenho; pense como será o dia em que me deixar, porque as pessoas se deixam, cedo ou tarde; você é o sexo mais indefinido que já conheci, você é o sorriso mais desproposital que já reparei, você é o silêncio do meu acordar, você é o bagunçar de cabelos mais desponderado que já gostei, você é o abraço menos demorado que já desejei, você não sabe como definem um alguém pra um alguém; sempre, com certeza, sem qualquer dúvida, te levarei do meu jeito mais sincero, mesmo quando estiver mentido, mesmo quando omitir, você será a minha bela, minha gostosa, minha... Porque é exatamente assim que te quero, sabendo que todo dia vou te conquistar. Ele levanta, beija-a na boca, puxa delicadamente os cabelos, aperta-a na nuca, e quando sente que não mais poderia dizer que não, fala: essa escolha de ser só minha deriva excessos que ainda desconhece, não sou de ninguém, mas não consigo te dizer que não quero isso em derivados dias, antes de dormir. Derivados não são todos, certamente não. Ele levanta da cama, suspira bem fundo, pensa por meio-segundo, e tira a camisa. 
    E a diz: amanhã defino meus amanhãs.